Voto a voto: o que disseram os ministros do STJ no julgamento que manteve o afastamento de Wilson Witzel do cargo de governador do Rio de Janeiro

Ministro Benedito Gonçalves havia determinado o afastamento na semana passada, na operação que investiga desvios na Saúde. Por 14 votos a 1, STJ decidiu manter a decisão. STJ mantém afastamento do governador do RJ, Wilson Witzel
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta quarta-feira (2) manter o afastamento de Wilson Witzel (PSC-RJ) do cargo de governador do Rio de Janeiro por suspeitas de desvios na Saúde no estado.
Por 14 votos a 1, os ministros da Corte decidiram acompanhar a decisão tomada na semana passada pelo relator do caso, ministro Benedito Gonçalves, que afastou Witzel por 180 dias, no contexto da Operação Tris In Idem. A operação investiga irregularidades e desvios em recursos da saúde do Rio de Janeiro.
Ao ser afastado, Witzel negou as acusações e se disse perseguido pelo governo federal. Nesta quarta, ele afirmou respeitar a decisão do STJ e voltou a alegar que não cometeu crimes.
ENTENDA: o afastamento de Wilson Witzel
TRAJETÓRIA: de fenômeno eleitoral a afastamento do cargo
A Corte Especial do STJ, que analisou o caso, é formada pelos 15 ministros mais antigos do tribunal. Eram necessários 10 dos 15 votos (quórum qualificado de dois terços) para que Witzel fosse mantido afastado da chefia do Executivo estadual. O presidente do STJ só vota em caso de empate.
A defesa de Witzel argumentou que o julgamento não deveria ser transmitido em razão da existência de elementos em segredo de Justiça no caso.
A Procuradoria-Geral da República chegou a pedir a prisão do governador, mas não foi atendida pelo STJ. O tribunal entendeu que o afastamento é suficiente para a paralisação das supostas ações criminosas.
Veja como foi o voto que confirmou o afastamento de Wilson Witzel do governo do RJ
Veja como votaram os ministros do STJ:
Benedito Gonçalves
Relator do caso e responsável por determinar o afastamento de Witzel do cargo na semana passada, o ministro começou seu voto rebatendo a defesa do governador. Afirmou que garantiu acesso dos advogados ao processo e negou pedido de que a sessão fosse reservada, defendendo a publicidade do julgamento.
“Se nós estivéssemos sem YouTube – estivesse na chamada normalidade –, como seria o julgamento perante à Constituição? Público? Então, o instrumento é YouTube. Eu voto pela publicização através do YouTube”, afirmou.
Em voto rápido, Gonçalves afirmou que determinou o afastamento por se tratar de medida menos gravosa que a prisão de Witzel, pedida pela Procuradoria-Geral da República. O ministro votou para manter a decisão integralmente.
“Foi pedida a prisão preventiva. Entendi que a prisão preventiva era mais gravosa. Entendi por optar por medida menos gravosa, que era afastamento”, disse o relator, ao pedir o referendo da cautelar.
“No meu voto eu coloquei a urgência. Até mesmo o pacote anticrime excepciona a urgência. Pela situação, como surgiu o inquérito. Submeta-se a esta Corte a decisão, no que concerne as medidas cautelares pessoais diversas da prisão. Pedindo a Corte então o referendo da decisão do afastamento.”
Francisco Falcão
Acompanhou o relator afirmando que, “diante da gravidade dos fatos”, não vê como não referendar a decisão.
“Os fatos são graves, merecem uma apuração e no momento em que vivemos, numa pandemia, onde já tivemos mais de 120 mil vítimas, é impossível que alguém que esteja sendo acusado e investigado possa continuar exercer o cargo tão importante de maior dirigente do Estado do Rio de Janeiro”, afirmou.
“Diante da gravidade dos fatos. Há comprovação de compras em dinheiro vivo. Não vejo como referendar a decisão proferida por benedito Gonçalves. Acompanho o relator.”
Nancy Andrighi
Disse que uma organização criminosa tendente a beneficiar agentes públicos justifica as medidas.
A ministra defendeu que todos os elementos apresentados pela Procuradoria são concretos e indicam a atuação de uma organização criminosa que atuava para fraudar licitações e beneficiar agentes públicos. Citou que há fortes indícios de que a gestão Witzel manteve o esquema criminoso que já era desenvolvido no governo Cabral.
“Ocorrem dezenas de pagamentos de despesas pessoais da família do governador em espécie”, citou. Segundo a ministra, o afastamento se faz necessário já que, segundo ela, a participação do governador “assume maior relevo na prática de atos administrativos inerentes à função pública”.
“No que diz respeito às provas da materialidade e indício de autoria, o eminente relator identificou os elementos: a expressão das quantias transferidas para empresas ao escritório da primeira-dama, sem prestação de serviços; apreensão de correspondências virtuais e-mails, com minutas do contrato em favor de empresas contratadas com o estado; troca de mensagens do governador com empresa beneficiada; escritório de advocacia da primeira dama estar desativado; fatos corroborados por outras circunstâncias; e dados decorrentes de quebra de sigilo bancário”, afirmou.
“São suficientes para caracterizar o fumus delicti, a presença de indícios de autoria. Têm realmente o condão de evidenciar a existência de relações espúrias entre o governador e empresas, em época de pandemia.”
Em seu voto, a ministra disse ainda “a existência de elementos indicativos de que ao menos uma das condutas delitivas ainda tem desdobramentos persistentes exige a cautela, o que se exige em lavagem de dinheiro, que é de caráter permanente”.
“Foi demonstrado que a liberdade dos requeridos gera riscos para a garantia da ordem pública. Existem fortes indícios da continuidade criminal dos esquemas. A ordem pública está não só em risco como em atual, intensa e grave lesão. Como arguido pela representante do MP, a situação de enfrentamento da pandemia tem sido usada para a continuidade de atos criminosos. (…) A participação do governador no suposto esquema criminoso assume relevo na prática de atos administrativos.”
Laurita Vaz
Também acompanhou o relator e argumentou que as medidas cautelares são necessárias para cessar as atividades criminosas, para impedir a reiteração.
“Há fortes evidencias de cometimento de crimes gravíssimos, envolvendo em primeiro plano o governador e a primeira-dama”, afirmou. “O material colhido nas buscas e apreensões, a quebra de sigilo, o depoimento de testemunhas reforça a ideia de crimes de corrupção ativa e passiva, organização criminosa, lavagem de capitais”, afirmou.
Segundo ela, “há evidência de vazamento de informações sensíveis da investigação porque se constatou que os requeridos foram informados da declaração da operação”. “No dia da busca e apreensão, foram encontrados elementos rasgados com investigados.”
A ministra também afirmou: “Entendeu o ministro relator que a organização criminosa atua de forma a não se perceber de antemão os intrincados vínculos entre agentes”.
“A decisão não está levando em consideração apenas dois atos imputados diretamente ao governador ocorrido em 2018, quando ele ainda estava em campanha eleitoral.”
Maria Thereza Assis Moura
Defendeu que o afastamento do chefe do Poder Executivo estadual deve ser uma medida a ser sempre tomada de forma colegiada. Mas afirmou que não viu prejuízo porque a decisão judicial foi prontamente trazida à Corte Especial.
“O Ministério Público foi expresso no sentido de que, além dos fatos narrados na denúncia, diversos outros merecem ser aprofundados inclusive com relação ao grau de atuação da organização criminosa em questão, que possui espectro de incidência delitiva em praticamente todos os setores do governo do estado do Rio de Janeiro”, afirmou.
“Trata-se, aqui, de governador de estado, eleito com mais de 4,6 milhões de votos. E aqui, mais uma vez, eu digo: embora exista expressa previsão regimental acerca da possibilidade da concessão de forma monocrática, como fez o relator, dessas medidas, acredito eu que, em se tratando do afastamento de autoridade com prerrogativa de foro, eleita pelo voto popular, a submissão dessa matéria à Corte Especial constitui a meu ver uma medida de prudência – que, me parece, ostenta maior compatibilidade com o princípio democrático.”
Napoleão Nunes Maia
Foi o primeiro a votar contra o afastamento de Witzel. Para o ministro, a permanência do governador do cargo deveria ser decidida por um juízo político, por decisão da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Ele criticou que a decisão inicial pelo afastamento de Witzel tenha sido tomada de forma individual, afirmou que o governador deveria ter sido ouvido antes da medida e avaliou que a Corte praticamente já estava julgando a denúncia. Também classificou o entendimento como uma cassação indireta.
“Penso que a decisão liminar do ministro Benedito Gonçalves, sem manifestar qualquer descontentamento com conteúdo da sua decisão, eu penso que ela não está a merecer da minha parte o referendo. Por uma razão fundamental. A submissão da questão de ordem à Corte supria, disseram. Não supre”, afirmou.
“Se o relator trouxer para apreciar uma questão desse porte – afasta ou não afasta? –, se permite o advogado falar. Será que podemos falar em ampla defesa num julgamento que não comporta fala do advogado? A decisão pode ser monocrática, mas preferencialmente colegiada. Porque permite o debate, defesa. O direito se vinga daquilo que é feito contra sua vontade. Não faço consideração de indícios porque não pude ouvir a defesa.”
Og Fernandes
Também acompanhou o relator afirmando que o ministro definiu um prazo claro de afastamento, que depois poderá ser revogado.
“Ministro [Benedito] teve cuidado de fixar um prazo. Um zelo que o relator teve bastante cuidado. Quer dizer o quê? Que, apurados os fatos que são objetos de investigação, concluído esse prazo, o ministro e o tribunal verificará necessidade ou não de prorrogação do afastamento”, ressalvou.
“Se o relator entender que antes da conclusão do prazo não há necessidade de submeter governador a essa medida cautelar governador e tribunal tomarão rumo assertivo em suspensão dessa medida.”
Luís Felipe Salomão
Votou com o relator, afirmando que não vê nenhum tipo de nulidade na cautelar determinada.
“A denúncia inicial envolve com contratos com mais de 835 milhões, contratos para fornecimento de respiradores, mais de 60 milhões. Naqueles documentos, o MP [alegou] com base nas provas recolhidas. Eu acho que tem elementos que demandam sigilo”, afirmou
“A partir de quebra de sigilo, o MP firmou convicção e apresentou denúncia. Medidas de caráter urgente que, se fossem tornadas públicas, comprometeriam a diligência. Não vislumbro nulidade com esse procedimento.”
Para Salomão, “há uma apuração em curso, com valores não dimensionados totalmente”.
Mauro Campbell
Também criticou que o afastamento de Witzel tenha sido determinado de forma individual pelo relator, defendendo que a decisão deveria ter sido colegiada. Mas citou que há evidências fortíssimas do suposto esquema que justificam a medida.
“Não possui justificativa forte o bastante para ter sido deferida monocraticamente, mas tal raciocínio resta prejudicado pela atual sessão, portanto convalida-se aqui essa legitimidade. Essa decisão tem que ser sempre colegiada”, afirmou.
“Tais fatos justificam a decretação de uma medida cautelar tão imperativamente agressora da democracia? Creio que a resposta é positiva.”
Raúl Araújo
O ministro afirmou que os elementos do processo mostram uma relação complicada entre negócios públicos e privados. Ele disse que não há indícios para justificar a prisão. Araújo disse que o afastamento é adequado, mas propôs diminuir a duração de 180 dias.
“Infelizmente não se pode negar se estar diante de serie de fatos e relações suspeitas por envolver mistura de vínculos profissionais e pessoais”, afirmou.
Isabel Gallotti
A ministra foi a décima a acompanhar o relator, formando o quórum qualificado para manter o afastamento. A ministra disse que há fortes indícios de prejuízo ao erário ao longo de toda a gestão de Witzel, continuando até os dias de hoje. “Indícios são graves, serão submetidos ao contraditório”.
Antonio Carlos Ferreira
Em seu voto, o ministro afirmou: “Estou acompanhando o voto do relator. A decisão é sem prejuízo de uma nova, uma futura análise, diante da natureza provisória que caracteriza as medidas cautelares”.
Marcos Buzzi
O ministro afirmou que há fortes indícios de materialidade e autoria para manter o afastamento.
“Entendo no mesmo sentido apontado pelo relator que estão evidenciados os serviços que se negam ter sido prestados, as minutas com as empresas contratadas, as evidências das relações espúrias entre Estado e empresas e agentes, a ativação da banca da advocacia da primeira-dama. São dados objetivos que estão, sim, nesta altura e nesta fase demonstrados”, disse.
Sérgio Kukina
O ministro divergiu do relator para também decretar a prisão preventiva de Witzel.
“Esse governador está rotulado, e há elementos, por ora, que sinalizam no sentido de ser ele o governador, o cabeça da organização criminosa. A meu sentir parece contraditório que todos os demais permanecessem presos e exatamente o cabeça estivesse em liberdade”, argumentou.
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By Fred Souza

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