STF retoma julgamento de suposto dossiê do governo sobre antifascistas

Tribunal julga ação apresentada pela Rede Sustentabilidade contra suposto dossiê produzido pelo Ministério da Justiça sobre centenas de servidores. Relatora já votou; faltam nove votos. STF retoma julgamento da ação contra relatório com informações sigilosas sobre servidores
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quinta-feira (20) o julgamento da ação do partido Rede Sustentabilidade que pede a suspensão imediata da produção, pelo Ministério da Justiça, de um relatório sigiloso, suposto dossiê contendo informações de quase 600 servidores públicos, a grande maioria ligada a movimentos antifascistas opositores do governo.
A análise começou nesta quarta-feira (19), com o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia, pela suspensão da produção de qualquer dossiê sobre cidadãos identificados como de grupos antifascistas pela pasta. Agora, os demais ministros devem apresentar os votos.
A Advocacia-Geral da União (AGU) e a Procuradoria Geral da República (PGR) pediram a rejeição da ação.
No voto, Cármen Lúcia rebateu os argumentos e afirmou que a ação se justifica: “Não é dito: ‘não é dossiê, não há relatório'”.
“A pergunta é simples: existe ou não? Se existe e estiver fora dos limites constitucionais, é lesão a preceito fundamental. Se não existe, bastaria dizer que não existe”, afirmou a ministra.
Cármen Lúcia também disse ter recebido do ministro da Justiça, André Mendonça, nota explicativa sobre o relatório e que, nessa nota, ele afirmou não ter solicitado relatório e só teve conhecimento da existência do documento pela imprensa.
“Benza Deus a imprensa livre do meu país, benza Deus que temos ainda Judiciário que tem conhecimento disso e que dá importância devida para a garantia da democracia no sentido de a gente verificar do que se trata, do que é e qual a resposta constitucional a ser dada”, disse a ministra.
STF vota ação que questiona susposto dossiê feito pelo Ministério da Justiça
Entenda o caso
Na ação, a Rede pede ao STF a “imediata suspensão da produção e disseminação de conhecimentos e informações de inteligência estatal produzidos sobre integrantes do ‘movimento antifascismo’ e professores universitários”.
A ação também pede a abertura de inquérito pela Polícia Federal “para apurar eventual prática de crime por parte do ministro da Justiça e Segurança Pública e de seus subordinados”, além da remessa dos conteúdos já produzidos ao STF para análise, com a manutenção provisória do sigilo.
Na semana passada, a ministra pediu informações ao Ministério da Justiça, que não confirmou nem negou a existência do dossiê. Em documento encaminhado ao STF, no qual não incluiu o relatório, o MJ afirmou que não coleta informações com intuito investigativo e que isso difere de atividade de inteligência.
Cármen Lúcia afirmou que, se a “gravidade do quadro descrito se comprovar, escancara comportamento incompatível com os mais basilares princípios democráticos do Estado de Direito e que põem em risco a rigorosa e intransponível observância dos preceitos fundamentais da Constituição da República”.
‘Arapongagem’
Em voto proferido no julgamento sobre fornecimento de dados à Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Cármen Lúcia já ressaltou que “arapongagem” (investigação clandestina) é crime e, quando praticada pelo Estado, “é ilícito gravíssimo”.
Ministra Cármen Lúcia diz que ‘arapongagem’ é crime
A existência do relatório foi revelada pelo portal UOL. Segundo a reportagem, “o Ministério da Justiça colocou em prática, em junho, uma ação sigilosa sobre um grupo de 579 servidores federais e estaduais de segurança identificados como integrantes do ‘movimento antifascismo’ e três professores universitários”.
Ainda conforme a reportagem, a pasta “produziu um dossiê com nomes e, em alguns casos, fotografias e endereços de redes sociais das pessoas monitoradas”. O relatório foi feito pela Secretaria de Operações Integradas (Seopi), ligada ao ministério.
Após a revelação da existência do documento, ministro da Justiça, André Mendonça, determinou a abertura de uma sindicância para apurar as circunstâncias da elaboração do relatório. Ele também substituiu o então diretor do órgão, Gilson Liborio.
A abertura da sindicância foi citada pela ministra em seu voto. “Se não há dossiê, do que estamos falando em matéria administrativa, que levou até a afastamento de servidor?”, argumentou a ministra, em referência ao afastamento.
No último dia 11, o suposto dossiê foi entregue à Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso Nacional. O presidente da comissão, senador Nelsinho Trad (PSD-MS), disse que assinou um termo de confidencialidade e que entregaria o relatório aos demais membros da comissão.
Na segunda-feira (17), o ministério anunciou a entrega do material ao STF e à PGR. Na terça (18), a ministra Cármen Lúcia determinou o envio do material as demais ministros da Corte.

By Fred Souza

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