Para melhorar aprendizado de aluno com síndrome rara, professora cria vaquinha virtual e compra máquina de escrever em braille


Sem aulas presenciais por causa da pandemia, Fellipe Gabriel Viana, de 14 anos, que quase não enxerga e tem problemas de audição, tinha que memorizar todos os conteúdos. Garoto mora em Maringá, no norte do Paraná. Com a máquina de escrever braille, o adolescente Fellipe coloca no papel o conteúdo de aulas e letras de rap
Reprodução/RPC
Com uma memória de dar inveja, o adolescente Fellipe Gabriel Viana, de 14 anos, portador de uma doença neurodegenerativa rara, é exemplo de dedicação e sinônimo de inspiração para a família e para a professora em Maringá, no norte do Paraná.
O aluno quase não enxerga e tem problemas de audição, tem a síndrome de Wolfram. Sem aulas presenciais desde o início da pandemia, ele passou a memorizar todos os conteúdos da escola. O colégio manda materiais adaptados, mas como não tinha uma máquina para escrever em braille, estudar estava ficando um pouco mais difícil.
“São muitos anos de prática”, se diverte o adolescente. “Cálculos de matemática faço todos na cabeça. Antes de ter a máquina precisava relembrar várias vezes o que o professor explicava. Era um pouco complicadinho”, acrescentou Fellipe.
Para ajudar o garoto a ter melhor qualidade de vida e de aprendizado, Maria Elizabeth Dumont Negrelli, a professora Betinha, que é guia-intérprete do menino desde julho de 2019, não se cansou até conseguir comprar a máquina que ele tanto precisava.
Organizou uma vaquinha virtual e, em 19 horas, conseguiu quase R$ 3 mil. O dinheiro foi suficiente para adquirir uma máquina usada que custou pouco mais de R$ 2.600. Uma nova é encontrada no mercado por mais de R$ 7 mil.
Fellipe tem a ajuda da guia-intérprete Betinha para conseguir acompanhar as aulas no ensino regular
Maria Elizabeth Dumont Negrelli/Divulgação
A professora Betinha, que é descrita pelos familiares de Fellipe como um anjo sem asas, conta que sem a ferramenta o menino estava sofrendo e apresentando déficit educacional.
“O Fellipe está classificado como surdocego, porque ele tem perda auditiva e visual. Dentro da sala de aula eu sou uma mediadora das disciplinas, adapto os materiais e repasso os conteúdos para ele. Quando surgiu a aula remota ficamos apreensivos, como poderíamos melhorar o atendimento”, explicou a professora.
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Ela conta que eles passaram e se comunicar pelo Whatsapp.
“Fiquei muito angustiada porque não tinha mais o contato tátil, e ele precisa muito disso. Mesmo achando incrível a memória dele. Dizia: ‘Felipe, você precisa colocar no papel todo esse conhecimento, as suas vivências, a sua história, porque está só na cabeça, precisa registrar isso”, disse.
Com autorização da mãe do adolescente, Betinha decidiu agir e ir em busca da máquina para ajudar o aluno. No caminho, contou com o apoio de 30 pessoas, que colaboraram com a vaquinha virtual, e também com a única pessoa em Maringá especializada em consertar máquinas de digitar em braile.
“A máquina usada que compramos veio com defeito e recorri a esse senhor. Ele se emocionou com a história do Fellipe e nem cobrou pelo serviço. Ele ainda decidiu apadrinha-lo, assumiu o compromisso de arrumar de graça a máquina sempre que for necessário”, contou a professora Betinha.
Com a máquina em casa, os dedos do menino, que é um exemplo de superação e de animação, agora não param. A ferramenta passou a ser um instrumento de liberdade para o garoto que se divide em estudar, publicar vídeos no Youtube, compor rap e sonhar que um dia será um biomédico.
“Tenho duas músicas prontas para serem gravadas, uma fala sobre persistência, em não desistir, e a segunda sobre gratidão. Sem a máquina, ia compondo e memorizando as músicas por partes, agora elas estão no papel”, contou.
O interesse pela biomedicima é pela intenção de pesquisar curas para diferentes doenças. “Acredito que até eu entrar na faculdade alguém já vai ter descoberto a cura para a minha síndrome. Mas, se até lá não tiver, eu vou pesquisar e vou achar”, enfatizou o garoto de 14 anos.
Sonho compartilhado pela mãe, Gislaine de Paula, e também pela professora que auxilia o adolescente a ir longe.
“Tudo é possível. Desde que a Betinha entrou na vida do Fellipe ela abriu portas, facilitou o aprendizado. Com a pandemia, o trabalho dela se tornou fundamental e a qualidade do ensino não diminuiu. Ela agregou muito à vida de todos nós”, enfatizou.
“A Betinha é uma pessoa incrível, é uma grande amiga”, afirma o garoto.
Para guia-intérprete, esta missão só se completa quando há apoio de todos os lados.
“É um orgulho, uma satisfação, um sentimento de missão sendo cumprida. Quanto que o nosso trabalho é importante para o desenvolvimento das pessoas, para que elas cresçam e produzam. Neste momento vale a pena. O Fellipe está se desenvolvendo e se reconhecendo quanto pessoa, quanto cidadão”, concluiu.
Fellipe usa a máquina para registrar sua história e as músicas que compõe
Reprodução/RPC
Professora faz vaquinha para comprar máquina de braile para aluno
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By Fred Souza

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