Ministro Edson Fachin é relator dos processos da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com ele, operação combate ‘renitente garantia da impunidade’. O relator dos processos da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, encaminhou ao novo presidente da corte, ministro Luiz Fux, um relatório no qual avalia que os trabalhos da operação “são pautados pela legalidade constitucional” e combatem a “renitente garantia da impunidade” existente no país.
De acordo com Fachin, a sociedade brasileira cobra, com cada vez mais vigor, melhores serviços públicos, mais eficiência das instituições estatais e na Justiça, e o resultado dos trabalhos das instituições que combatem a corrupção e a lavagem de dinheiro no país é fruto dessas “históricas demandas”.
“Penso que é exatamente como um esforço de aprimoramento da jurisdição, um esforço por maior eficiência, que deva ser visto o trabalho de diversas instituições no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro. Tais esforços são, antes de tudo, frutos de uma histórica demanda por mais eficiência na justiça e por maior qualidade na prestação de serviços públicos. Eficiência e qualidade que necessariamente respeite o contraditório, o direito de defesa, o devido processo legal”, diz Fachin no documento.
O documento foi enviado em um momento no qual a operação passa por uma série de questionamentos e mudanças. O procurador-geral da República, Augusto Aras, já defendeu a necessidade de “corrigir rumos” da operação e o fim do “punitivismo” do Ministério Público.
Aras também critica a centralização de informações levantadas pela operação, que ele comparou a uma “caixa-preta”. Em julho, atendendo a um pedido de Aras, o então presidente do STF, Dias Toffoli, determinou que a base de dados sigilosa da Laja Jato fosse enviado à PGR. Em agosto, porém, Fachin revogou a decisão.
No início de setembro, o coordenador da Lava Jato em Curitiba, procurador Delta Dallagnol, anunciou que deixaria a força-tarefa. Ele justificou a decisão à necessidade de se dedicar a questões de saúde na família. A saída, porém, acontece depois de uma série de desgastes e em meio ao atrito com a PGR envolvendo o compartilhamento de dados sigilosos.
Também em setembro, sete procuradores da força-tarefa da Lava Jato em São Paulo apresentaram um pedido de desligamento coletivo ao procurador-geral da República, Augusto Aras. Eles alegaram “incompatibilidades insolúveis com a atuação da procuradora natural dos feitos da referida força-tarefa, Dra. Viviane de Oliveira Martinez”, procuradora natural que assumiu as atividades do grupo em São Paulo no mês de março.
No fim de agosto, a força-tarefa em Curitiba pediu à PGR a prorrogação dos trabalhos por mais um ano. A PGR, porém, decidiu prorrogar somente até janeiro de 2021.
A estrutura da força-tarefa da Lava Jato no Paraná foi criada em abril de 2014, um mês após a primeira operação ter sido deflagrada. Desde então, os trabalhos foram prorrogados sete vezes.
‘Punitivismo’
No balanço sobre a operação Lava Jato, o ministro Fachin também avalia que é um “erro equacionar a luta pela responsabilização e o combate à impunidade com um aumento do ‘punitivismo’, assim como é errado imaginar que o programa da Constituição de 1988 foi o de criar amarras para a eficiência dos serviços públicos”.
“A síntese de Ulysses Guimarães continua atual: a Constituição tem ódio e nojo da ditadura, mas ‘a corrupção é o cupim da República'”, acrescentou ele. Segundo análise do ministro, “é possível ao mesmo tempo ser democrático e combater a corrupção pelo aprimoramento do sistema judicial”.
“A polarização impõe um falso dilema à sociedade: ou se combate o ‘punitivismo’, ou retomaremos o arbítrio, como se o estado de coisas anterior, no qual grassou por anos a ineficiência e deitou raízes o cupim da República, fosse o único apanágio da democracia. Por tudo isso, é preciso que não abandonemos os esforços por uma justiça mais eficiente e por uma democracia mais justa, com irrestrita observância ao ordenamento jurídico que cunha o Estado de Direito”, acrescentou ele.
O ministro Fachin também afirmou que o STF, a tempo e modo, declarou legitimamente o sistema prisional brasileiro “em estado de coisas inconstitucional”. “Um olhar sobre a seletividade do sistema penal pode quiçá auxiliar a compreensão do que também dizem os dados que seguem em anexo. A Justiça Criminal brasileira criou e mantém um sistema injusto, profundamente desigual entre segmentos mais abastados da sociedade e cidadãos desprovidos de poder econômico ou político”.
Na visão do relator da Lava Jato, o sistema criminal é “injusto e desigual” para a “parcela menos abastada da população e é leniente com os poderosos às voltas com práticas criminosas”.
“Quem atesta esse fato? O CNJ. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça do total aproximado de 800.000 presos, é a pobreza que está no cárcere; dos quase 35% dos presos sobre os quais há informação sobre escolaridade, 99% possuem apenas até o ensino médio incompleto, sendo expressiva a quantidade de analfabetos e aqueles somente com nível fundamental; a raça também é um ingrediente da seletividade punitiva: as pessoas presas de cor preta e parda totalizam 63,6% da população carcerária nacional, consoante dados do Infopen (Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias) de junho de 2017”, disse o ministro, no documento.
Para ele, o “mais grave” seria o fato de que “apenas 1,43% dos presos responde por crimes contra a Administração Pública”. “Por aí, Senhor Presidente, consoante é consabido, se percebe com nitidez quem é, tradicionalmente, infenso à lei penal. Isso não significa, de modo, mitigar garantias constitucionais, pois somente na legalidade constitucional é possível encontrar respostas”, concluiu.